quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Caso Guarani-Kaiowá e "o que queremos para o mundo?"

Infelizmente casos de assassinatos no campo e genocídio indígena na contemporaneidade não são novidades... com profunda tristeza faço tal afirmação, mesmo sabendo de toda proteção jurídica existente aos direitos humanos e direitos dos povos, tanto no plano doméstico, avanços de nossa Constituição Cidadã,  quanto no plano internacional, com a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas (2007) e Convenção n. 169 da OIT sobre os Povos Indígenas e Tribais (1989), ratificada pelo Brasil em 2002 e promulgada pelo Decreto 5.051 de 19 de abril 2004
O que nos resta, nesse momento, é jogar luz para os povos que sempre viveram na invisibilidade da mídia, da política e da justiça, sempre invisíveis perante a sociedade opressora, que acaba por legitimar ações de pistoleiros, de latifundiários, grileiros de terras, assim como ações e políticas do próprio governo que passa por cima dos seres humanos oprimidos e "esquecidos" propositalmente, como podemos observar no insistente discurso do crescimento econômico, o mesmo que legitima os megaempreendimentos na Amazônia, destruindo florestas e massacrando os povos da floresta 
Não obstante o destino trágico da "morte anunciada" pela via da espoliação da terra, os nossos guerreiros não se entregam e fortemente e coletivamente dão o "grito dos excluídos" pelo direito à vida, à dignidade, integridade física, cultural e espiritual que está intrinsecamente ligada ao direito territorial. 
Importante jogar luz para os fatos [Nota sobre o suposto suicídio coletivo dos Kaiowá de Pyelito Kue, Estudo denuncia produção de soja e cana em terras dos Guarani-kaiowá]  para que a sociedade hegemônica aprenda a conviver com os grupos étnicos, caminhando para o reconhecimento da existência da plurinacionalidade dentro do Estado brasileiro e reconhecimento da livre-determinação dos povos.
Nesse sentido, devemos somar às lutas territoriais atuais, a luta pela verdade, contra as injustiças e atrocidades cometidas em nosso passado recente [ Casa da Cultura do Urubuí denuncia Genocídio do Povo Waimiri-Atroari1º Relatório do Comitê Estadual da Verdade: O GENOCÍDIO DO POVO WAIMIRI-ATROARI], visando fortalecer nosso sentimento de resistência e de consciência coletiva de que somos co-autores de nossa história e, portanto, co-autores de nosso futuro! 
É importante nesse momento de tensão divulgar e compartilhar as denúncias dos atentados contra a vida desses povos, nos unirmos em prol da resistência humana e levarmos o caso até a Corte Interamericana de Direitos Humanos, pois a resistência simbólica, jurídica e política ganha força com cada caso e cada precedente internacional favorável aos povos e minorias étnicas e vulnerabilizadas. 
Seguiremos caminhando... acreditando que estamos em uma fase de transição, ideal que fosse sem derramamento de sangue, mas nos sertões do Brasil não é isso que vemos... Se tivéssemos ao menos uma mídia sensata, responsável, imparcial para retratar de fato nossa realidade, sem ser corrompida pelos "donos do Poder e das terras", teríamos uma sociedade mais consciente, humana e intolerante às injustiças sociais.
Por isso mesmo devemos seguir com esperança, dando voz e vez aos excluídos!

Segue vídeo do projeto "O que queremos para o mundo?", com crianças e jovens Guarani-Kaiowá. 






Atualizo este post, divulgando os registros áudio-visuais feitos por Pedro Rios, publicado em 27 de outubro de 2012, com relatos e carta-denúncia sobre as tensões e violências ocorridas em Passo Piraju e pressões do agronegócio para despejo iminente da aldeia e consequente "Extermínio dos Guarani Kaiowa. Passo Piraju."



sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Desmatamento e dano moral coletivo

Em meio aos retrocessos na legislação, agora nossa esperança é o Judiciário seguir cumprindo bem o seu papel "pró ambiente"...
Segue notícia:

Réus que desmataram meio ambiente são condenados por dano moral coletivo



Tribunal entendeu que, havendo ofensa à moral da coletividade, deve haver indenização O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), em Brasília, ao julgar dois processos recentemente, aplicou o conceito de dano moral coletivo para condenar três réus a pagarem indenização por desmatar áreas de preservação ambiental. A questão é motivo de controvérsia no meio jurídico. Por um lado, a Constituição da República prevê a indenização por dano moral praticado apenas a uma pessoa, mas doutrinadores e tribunais vêm aplicando o conceito à coletividade, como foi o caso do TRF1. Em um dos julgamentos, a 5ª Turma rejeitou o recurso de Antônio Pereira da Silva e Edevilson Vicentin, acusados de destruir, no ano de 2008, 569,5 hectares de vegetação na terra indígena Sararé (MT), por meio do corte seletivo de madeira destinada à exploração econômica. A ação inicial, ajuizada pelo MPF, pedia a reparação do dano ambiental com pagamento de danos materiais e morais coletivos. Na mesma sessão, a turma analisou um recurso do Ibama, que pedia a condenação de Maria Aparecida Milhomens Brito por dano moral coletivo. A ré já havia sido condenada em 1ª instância a apresentar um Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) por desmatar entre 2004 e 2005, 52 hectares de floresta amazônica nativa, sem autorização do órgão competente, em local denominado Sítio Mato Grosso, na cidade de Porto Velho (RO). O resultado dos dois julgamentos indica uma tendência à aceitação, por parte do TRF1, da reparação por danos morais coletivos. Em ambos os casos, a turma entendeu que, “embora a coletividade não tenha personalidade jurídica, tem interesses legítimos, valores e patrimônio ideal que devem ser protegidos.” Segundo a Turma, a constatação do dano moral coletivo deve estar associada a uma ofensa à moral da comunidade, fato que foi verificado nos casos julgados. Fonte: MPF – Ministério Público Federal
http://amazonia.org.br/2012/10/reus-que-desmataram-meio-ambiente-sao-condenados-por-dano-moral-coletivo/

Carta Guarani-Kaiowá

Carta da comunidade Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS para o Governo e Justiça do Brasil
Nós (50 homens, 50 mulheres, 70 crianças) comunidades Guarani-Kaiowá originárias de tekoha Pyelito kue/Mbrakay, vimos através desta carta apresentar a nossa situação histórica e decisão definitiva diante de despacho/ordem de nossa expulsão/despejo expressado pela Justiça Federal de Navirai-MS, conforme o processo nº 0000032-87.2012.4.03.6006, em 29/09/2012.
Recebemos esta informação de que nós comunidades, logo seremos atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal de Navirai-MS. Assim, fica evidente para nós, que a própria ação da Justiça Federal gera e aumenta as violências contra as nossas vidas, ignorando os nossos direitos de sobreviver na margem de um rio e próximo de nosso território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay.
Assim, entendemos claramente que esta decisão da Justiça Federal de Navirai-MS é parte da ação de genocídio/extermínio histórico de povo indígena/nativo/autóctone do MS/Brasil, isto é, a própria ação da Justiça Federal está violentando e exterminado e as nossas vidas. Queremos deixar evidente ao Governo e Justiça Federal que por fim, já perdemos a esperança de sobreviver dignamente e sem violência em nosso território antigo, não acreditamos mais na Justiça Brasileira.
A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas?? Para qual Justiça do Brasil?? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós. Nós já avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo, não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui na margem do rio quanto longe daqui. Estamos aqui acampados 50 metros de rio Hovy onde já ocorreram 4 mortos, sendo 2 morreram por meio de suicídio, 2 morte em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas. Moramos na margem deste rio Hovy há mais de um (01) ano, estamos sem assistência nenhuma, isolada, cercado de pistoleiros e resistimos até hoje. Comemos comida uma vez por dia. Tudo isso passamos dia-a-dia para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay.
De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs e avós, bisavôs e bisavós, ali estão o cemitérios de todos nossos antepassados. Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser morto e enterrado junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui. Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação/extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais.
Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal, Assim, é para decretar a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e para enterrar-nos todos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem morto e sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo de modo acelerado. Sabemos que seremos expulsas daqui da margem do rio pela justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo/indígena histórico, decidimos meramente em ser morto coletivamente aqui. Não temos outra opção, esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS.